Edu
A bioeconomia da senescência

"A natureza nos dá a vida, como dinheiro emprestado a juros, sem fixar o dia da restituição" (Cícero).'' O passado é lenha calcinada. O futuro é o tempo que nos resta: finito porém incerto. O grau de indeterminação desse futuro, entretanto, não é total. Se é verdade que a cada momento mais coisas podem acontecer do que de fato acontecem, isso não significa que, por conseguinte, tudo seja então absolutamente possível. O tempo vindouro encerra múltiplas possibilidades, mas o território do factível não é desprovido de fronteiras, ainda que em muitos casos elas sejam difíceis de demarcar ou passíveis de futuro redesenho. O caos existe, apronta, mas não impera. A experiência revela que o subconjunto das coisas que de fato acontecem — o futurível trilhado — tende a obedecer em larga medida, pelo menos no que diz respeito à esfera da vida comum, a padrões de robusta e previsível regularidade.
A fínitude biológica não predetermina a extensão e a qualidade da jornada. Embora cada membro de uma dada população tenha uma trajetória única e singular pela vida, a "lei dos grandes números" define regularidades que se aplicam ao conjunto das diferentes populações e demarcam os parâmetros básicos dentro dos quais cada um de seus membros deverá trilhar seu caminho. No mundo natural, como na vida em sociedade, o comportamento do todo tende a ser mais regular e previsível que o das partes que o integram. O que vale para todos baliza e comporta, ainda que não determine por completo, o trajeto das partes individuais. As etapas do ciclo de vida e o risco de morte por causas internas (não malthusiana) a que estamos sujeitos -- processos naturais comuns a todos -- ilustram bem essa realidade."

Giannetti, Eduardo, 1957-
O valor do amanhã: ensaio sobre a natureza dos juros
Eduardo Giannetti -- São Paulo : Companhia das Letras, 2005
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Esse é o início do segundo capítulo do livro que estou lendo agora (ou pelo menos, tentando...). Eduardo Giannetti é um economista e filósofo, PhD pela universidade de Cambridge, etc.

Ele traça paralelos entre situações cotidianas e naturais para explicar juros. É absurdamente inteligente e confesso que tremo a cada novo capítulo. rsss As vezes acho que não tenho alcance para tamanha elegância de raciocínio.

Enfim, acho que nesse momento da minha vida, o livro "casou" com a situação. É engraçado as voltas que o mundo dá. O suposto "destino" ou as coincidências que acontecem em nossas vidas. Como ele diz, "o caos apronta, mas não impera". Passando por um momento bastante conturbado profissionalmente, percebi na carne que por mais fatídicas que sejam nossas previsões, o futuro nos trás também outras possibilidades que não haviamos avaliado, ou apenas não passava de um pensamento improvável.

Por mais encerrados que estejamos nas regras quase que absolutas do tal futurível trilhado, eu adoro o poder que a vida tem de nos surpreender.

Viver é tudo de bom !

Beijos à todos. E embora tenha sido um post meio "cabeça", saiu numa tacada só.

Edu

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3 Responses
  1. Paulo C. Says:

    O cara é o máximo, Edu. Li dele, Auto-Engano. Você disse tudo! Nunca vi tanta elegância de pensamento. A palavra é essa: elegância!
    Vou procurar esse O Valor do Amanhã


  2. Paulo C. Says:

    Depois de tanto tempo nos sentindo meio vazios, como é impressionante a gente ver quão pleno de conteúdos estamos a ponto de "expelir" um texto tão forte, escrito "numa tacada só".
    A gente só pensa que está vazio. Ou ainda não chegou no ponto de explosão.
    Maravilha, Edu!!!


  3. Andréa Says:

    O Giannetti lançou um livro aqui, faz uns 4 anos e eu bobeei, esqueci de comprar. Gosto muito dele. Sempre que assisto uma entrevista com ele fico impressionada. E como disse o Paulo, maravilha de post, Edu!
    Beijos.